domingo, 29 de janeiro de 2012

Quem lê jornal realmente sabe mais. Principalmente se for no jornal de papel

Deu hoje na Folha de S. Paulo.


Leitor 'se engaja' mais na notícia impressa
Estudo de universidade dos EUA diz que o meio é um importante indicador para a retenção de dados após a leitura
Grupo leitor do 'NYT' no papel recordou mais notícias, tópicos e trechos dos textos do que quem o leu no site

Jeff Chiu/Associated Press
Consumidora de San Francisco compra exemplares do "New York Times"; leitor do impresso recorda mais que o da web
Consumidora de San Francisco compra exemplares do "New York Times"; leitor do impresso recorda mais que o da web


NELSON DE SÁ
ARTICULISTA DA FOLHA
Um estudo da Universidade de Oregon, nos Estados Unidos, levantou que um leitor de jornal em papel retém mais que um leitor on-line.

Intitulado "Medium Matters" -"questões de meio" em uma tradução mais literal ou, em trocadilho, "o meio importa"-, é uma análise sobre o "engajamento com jornais" nos dias de hoje.

Em suma, diz o estudo, "os leitores on-line tendem a escanear os textos, enquanto os leitores de impresso tendem a ser mais metódicos".

Mais especificamente, o leitor do "New York Times" impresso recorda em média "significativamente mais notícias" (9,6) que o leitor do site do jornal (7,3). Ele também relembra "significativamente mais tópicos" (4,2) que o leitor on-line (2,8). Por tópico, o levantamento entende a essência de cada texto.

Também quanto aos pontos principais -ou seja, os trechos importantes distribuídos ao longo do texto- o leitor do jornal impresso recorda mais (4) que a pessoa que lê na mídia on-line (2,8).

O único empate na comparação entre papel e site acontece na lembrança de títulos, mais superficial.
A pesquisa registrou o comportamento de 45 estudantes da própria universidade, na grande maioria (77%) habituados a obter suas notícias via internet. Eles foram divididos em dois grupos, para a leitura monitorada das versões em papel e on-line do "New York Times".

Arthur Santana, um dos três autores da pesquisa e que foi repórter e editor do "Washington Post", avisa que os resultados em nada alteram "o que está ocorrendo com os jornais, ao menos neste país [EUA], onde prosseguem em declínio gradual".

O pesquisador não acredita que esses resultados sejam indicação de que "os jornais ainda têm uma função útil e necessária". Santana afirma, entretanto, que "é importante", inclusive para os próprios jornalistas, "saber e compreender".

CONCENTRAÇÃO
A principal explicação para a diferença na retenção seria que um site não apresenta as notícias com a gradação de importância que o papel apresenta. Não dá tantas "indicações de ênfase" ao leitor e, assim, acaba por não cumprir a "função de estabelecer agenda", característica histórica dos jornais impressos.
O levantamento da Universidade de Oregon também "demonstra que o desenvolvimento de formas dinâmicas [de edição nos sites] teve pouco efeito" no sentido de melhorar a retenção.

Arthur Santana lembra Nicholas Carr, autor de "The Shallows" -"os rasos", obra traduzida no Brasil como "A Geração Artificial" (editora Agir). O livro questiona os efeitos da internet sobre a capacidade de "concentração e contemplação".

Para o pesquisador, as próprias pessoas hoje se condicionam a ler "apressadamente, dispersamente, desengajadamente", seja como for.

COEXISTÊNCIA
Para Jack Shafer, crítico de mídia da agência de notícias Reuters, "embora o número de leitores testado seja pequeno, o estudo confirma meu viés de que o impresso é superior".

Shafer passou um ano sem ler a versão impressa do "New York Times", acreditando que não era mais necessário, pois o site já se mostrava superior. Voltou a assinar quando começou a sentir "falta das notícias". 

Ele diz que gastava horas no site, mas "não lembrava", pois a leitura on-line "havia afetado minha capacidade de retenção".

Apesar de ter recuado ao experimentar ficar sem ler no papel, Shafer diz não ser "nenhum ludita", referência ao movimento que reagiu às máquinas nas fábricas têxteis inglesas, no século 19, durante a Revolução Industrial.

"Você não pode pesquisar em papel e você só tem acesso a um punhado de edições de fora da cidade, no dia em que são publicadas; portanto, fico contente que os dois meios coexistam."


Na publicidade, pesquisa indica efeito semelhante
DO ARTICULISTA DA FOLHA


Um segundo estudo dos autores de "Medium Matters", intitulado "Advertising Affinities" -"afinidades de publicidade"-, obteve resultados semelhantes quanto à retenção. O leitor do impresso recorda, em média, 1,3 anúncio publicitário, enquanto a pessoa que lê a publicidade on-line recorda 0,7.

Segundo Arthur Santana, um dos pesquisadores da Universidade de Oregon, um motivo é que os anúncios impressos "são estáticos, não mudam, enquanto no on-line têm natureza efêmera".
O mesmo grupo de pesquisadores se prepara agora para estender o estudo a tablets e smartphones, "especificamente iPad e iPhone, porque todo mundo parece ter um".

Questionado, Santana arrisca que, "em linha com a pesquisa, minha teoria seria que as pessoas que leem suas notícias via iPad e iPhone têm a mesma taxa de retenção dos que leem num laptop ou num desktop".
Em outras palavras, "a imprensa deve continuar sendo um meio melhor de receber e lembrar das notícias".
Eugênio Bucci, professor da Escola de Comunicação e Artes da USP e autor de "Sobre Ética e Imprensa", diz que "internet e tablet são completamente diferentes".

Para ele, "o tablet substitui o caminhão de entrega", ou seja, muda só a forma de distribuir. "É evidente que quem trabalha em jornal não trabalha na indústria gráfica, mas na produção de conteúdo."
Por sua própria experiência e também pela convivência com os alunos de jornalismo na USP, avalia que o tablet "está cada vez mais perto da leitura em papel e tem uma retenção e uma credibilidade equivalentes", no caso dos aplicativos de jornal.

Lembra que "o hardware ainda está na pré-história", devendo se aproximar mais e mais do ritual do papel. (NS)


sábado, 21 de janeiro de 2012

Escritor tenta desmistificar jornalistas

Deu hoje na Folha. Já encomendei o meu no escuro. Me pareceu bem interessante. Leiam a matéria e a resenha:



Jornalistas sem edição
"Os Imperfeccionistas", primeiro romance de Tom Rachman, revela humor e melancolia na vida de quem faz um jornal diário
Kirsty Wigglesworth/Associated Press
O britânico Tom Rachman, autor de "Os Imperfeccionistas"
O britânico Tom Rachman, autor de "Os Imperfeccionistas"
FABIO VICTOR
DE SÃO PAULO


Antes de se tornar escritor elogiado pelo romance "Os Imperfeccionistas", que sai agora no Brasil pela Record, o britânico Tom Rachman, 37, trabalhou como jornalista na agência de notícias Associated Press e no diário International Herald Tribune.

Rachman, que, como muitos colegas, alimentava o desejo de se tornar ficcionista, ficou algo assustado com a carreira.

"As pessoas esperam algo de você, imediatamente. Você senta pressionado para escrever uma reportagem, mas a realidade é muito mais complicada que aquilo", disse, em entrevista por telefone, de Londres, onde vive.

"E, então, falam: você tem uma hora, meia hora, dez minutos... E você está cercado de gente raivosa, competitiva, agressiva."

Segundo ele, essa pode ser "a sensação mais terrível do mundo". "Mas, depois de um tempo distante [após abandonar a profissão], percebi que esse universo pode ser também fonte de humor."

"Os Imperfeccionistas" está mesmo cheio de um humor, mas não um humor cômico, antes melancólico. Guarda um realismo ao mesmo tempo fascinante e constrangedor para quem habita o ambiente das redações jornalísticas.

Os personagens do romance, todos ligados ao cotidiano de um fictício jornal internacional baseado em Roma, são figuras complexas, por vezes admiráveis, mas em geral meio ridículas, como quase todo mundo ao ser visto mais de perto.

Os direitos para transformar o livro em filme foram comprados pela produtora Plan B, do ator Brad Pitt, que contratou o roteirista Scott Silver (de "O Vencedor") para adaptá-lo às telas.

LIVROS
Escritor tenta desmistificar jornalistas
Tom Rachman, autor de "Os Imperfeccionistas", usou prática na profissão para criar personagens hiperrealistas
Reação positiva de colegas do mundo inteiro ao romance fez autor perceber feição universal da carreira
DE SÃO PAULO

"Imperfeccionistas" é uma palavra que não existe em inglês nem em português.

Tom Rachman criou o neologismo ao perceber que todos os seus personagens "eram meio imperfeitos".
Quis também, conta, indicar ao leitor que o livro "não era o típico romance com o mesmo chefe atrás de sua mesa, mas um romance de grupo, com histórias separadas".

São 11 capítulos entrelaçados, batizados por manchetes e cada um ressaltando um personagem, cujo cotidiano no jornal é contado em sintonia com sua vida privada.

Há o velho correspondente decadente que, sem conseguir mais publicar reportagens, inventa uma; o obituarista desconsolado pela morte da filha; a editora-chefe que, traída pelo marido, assedia o ex-namorado.

Lá estão o jovem repórter desorientado; a redatora infeliz que vai para um hotel todo Ano-Novo para não ficar só em casa; o editor-executivo workaholic que é traído pela mulher; a diretora financeira seduzida pelo jornalista demitido; o herdeiro que arruína o jornal etc.

Entre cada capítulo, é descrita a história do diário global não nominado -que, apesar das semelhanças, o autor jura não ser inspirado no "International Herald Tribune".

SEMPRE AQUÉM
"O perfeccionista busca um ideal que nunca pode ser realizado. Meus personagens imperfeitos estão constantemente lutando, mas estão sempre aquém", diz o autor.

"Tenho mais empatia com pessoas que tentam o máximo que podem, mas ao final são imperfeitas."
Rachman afirma que usou sua prática na profissão para desmistificá-la. "Geralmente, o estereótipo do jornalista é oito ou oitenta: ou são heróis, revelando escândalos e corrupção, ou são vilões, interesseiros atrás de poder."

"Minha experiência mostra que muito poucos se encaixavam nessas categorias. A maioria eram pessoas simples, mas com feições muito complexas."

O escritor relata que, embora tenha inventado muito, cada personagem guarda um pouco dele próprio. Entre todos, diz se identificar mais com o jovem e atrapalhado aspirante a repórter Winston.

"Minha experiência quando era muito jovem foi parecida, me sentia tão incompetente, sem saber o que fazer. Como Winston, eu gosto das pessoas, mas a realidade costuma ser bem mais difícil."

A reação dos jornalistas ao livro foi, segundo Rachman, estimulante. Ele diz que, antes do lançamento (em 2010), colegas estavam apreensivos, achando que seriam expostos de modo depreciativo.

"Para meu alívio, não tive muitas queixas. Ao contrário, muitos jornalistas que eu não conhecia, de vários países, me procuraram para dizer: 'Eu conheço este personagem, eu trabalhei com esta pessoa'."

Foi aí que ele descobriu algo revelador: "A feição do jornalista típico é muito mais universal do que eu pensava. Achava que o que eu descrevia seria verdadeiro dentro da minha própria experiência cultural, mas não necessariamente em outros lugares."

"Mas ouvi de pessoas de todos as partes -países latinos, escandinavos, norte-americanos etc.- que os personagens condiziam com gente que eles conheciam."

FIM DO JORNAL
Como não vale detalhar o desfecho, basta dizer que "Os Imperfeccionistas" não traz um fim esperançoso para a imprensa tradicional.

O autor acha que o fim do jornal de papel é, como se diz, inevitável?

"Prever o futuro em relação à tecnologia é muito difícil hoje, a mudança é muito rápida. Mas acho muito difícil imaginar um futuro muito longo para o jornal de papel."

"Ele deve continuar a existir como uma forma marginal de informação, para ocasiões em que você não puder ter acesso ao universo on-line."

Rachman considera que o meio e o formato pelo qual se recebe a informação também mudam a própria informação. "Se começarmos a usar mais tablets e celulares, teremos informações mais estreitas e direcionadas, sobre os assuntos que mais nos interessam." (FABIO VICTOR)


Blog do professor PC indica: A Imprensa Gay no Brasil, o livro

Deu hoje na Folha. Já encomendei o meu. Sem preconceitos. Faz parte da história do Jornalismo. E pelo que li na Folha (ver abaixo), recomendo:


Livro relembra as publicações gays da imprensa no Brasil
"A Imprensa Gay no Brasil", de Flávia Pèret, mostra do ativismo de "Lampião", nos anos 1970, à "G Magazine"
Obra é a primeira da série "Folha Memória", que seleciona, todos os anos, pesquisas sobre jornalismo no país
DE SÃO PAULO


Autor de "Fina Estampa", que criou o caricato personagem Crô, Aguinaldo Silva já esteve na vanguarda da militância gay no país.

O escritor -que é homossexual, contrário ao beijo gay em novela- ajudou a fundar o "Lampião da Esquina", o primeiro jornal engajado editado por ele entre 1978 e 1981.

Foi alvo de ataques de grupos paramilitares e esteve na lista de publicações a serem banidas. Seus diretores foram acusados de "atentado ao pudor" pelo Ministério da Justiça e responderam a um inquérito policial, arquivado.

Em 1979, "O Lampião" entrevistou Luiz Inácio Lula da Silva, então dirigente sindicalista, para uma matéria sobre machismo na esquerda.

Na reportagem, o ex-presidente disse "que homossexualismo na classe operária era coisa que ele não conhecia".

Os bastidores da atuação de Aguinaldo Silva no movimento gay é resultado de pesquisa de Flávia Pèret, autora de "Imprensa Gay no Brasil".

O livro, que será lançado na próxima semana pela Publifolha, é o primeiro da série "Folha Memória", um projeto da Folha que seleciona, por meio de um concurso anual, três propostas de pesquisa sobre a história do jornalismo brasileiro.

Os escolhidos têm seis meses para finalizar a pesquisa -paga com patrocínio da Pfizer- e escrever um livro. O melhor é publicado.

Segundo Pèret, o "Lampião" acabou por um racha entre Silva e o escritor João Silvério Trevisan, outro fundador. No ano seguinte, ele foi contratado pela Globo.

"Não posso dizer que faço isso [criar personagens gays] por ativismo, mas, se a gente analisar bem, vai perceber que não deixa de ser uma forma de militância", diz.

VIRARAM PURPURINA
O livro mostra que, em quase cinco décadas, a história dos veículos gays se repete: sucumbem diante das dificuldades financeiras, geradas principalmente pela escassez de anúncios. "Foi assim com o 'Lampião, e, em parte, com a 'Sui Generis' [revista]", diz.

A "G Magazine", primeira a exibir ensaios fotográficos de famosos em nu frontal, é outro exemplo.
Ela surgiu em 1997, se sustentou por alguns anos, mas, no final, acabou lançando revistas pornográficas para gerar receitas. Em 2008, foi vendida a um grupo estrangeiro.

Recentemente, parte das publicações migrou para a internet e ganhou vida nova.

Mas, ainda segundo Pèret, a proposta editorial mudou. Em vez do ativismo político, os títulos focam na "militância de mercado": o que os gays consomem, como se comportam e seus ícones.

A IMPRENSA GAY NO BRASIL
AUTORA Flávia Pèret
EDITORA Publifolha
QUANTO R$ 19,90 (136 págs.)

Nova Mídia X Velha Mídia

A Folha de hoje está muito boa para jornalistas, professores de Jornalismo e especialmente estudantes de Comunicação. Também recomendo a leitura deste artigo.


ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
Nova mídia x velha mídia
Não sei até quando bater na "velha mídia" vai garantir às empresas de web essa pose de revolucionárias

Em meio ao tiroteio, os astutos políticos americanos decretaram: "Meia volta, volver!". Aconteceu nesta semana. Grandes empresas e organizações da internet lançaram uma campanha virtual contra dois projetos de lei antipirataria que estavam a ponto de ser aprovados, com facilidade, no Senado e na Câmara dos EUA. Webativistas do mundo todo abraçaram a causa.

A primeira a perceber a virada da maré foi a Casa Branca. No sábado, disse em comunicado que não apoiaria leis que "ameaçassem uma internet aberta e inovadora".

Deputados e senadores vieram na sequência. Passaram a esconjurar os dois projetos, conhecidos pelas siglas "Sopa" e "Pipa" (é só coincidência que essas palavras queiram dizer alguma coisa em português).

Com apoio de Hollywood e do que restou das grandes gravadoras, "Sopa" e "Pipa" comporiam, em tese, uma nova legislação de combate à pirataria na web. Mas, na visão dos empresários e/ou pensadores do Vale do Silício, sede das grandes corporações on-line, também causariam um cerco brutal ao fluxo livre de informações na rede.

Sites americanos poderiam ser condenados se trouxessem qualquer link para endereços em que a pirataria rola solta, como thepiratebay.org ou isohunt.com. Por exemplo: se você procurasse no Google "como baixar filmes de graça" e a busca indicasse um site de pirataria, o Google poderia ser punido.

Até os provedores de acesso estavam na mira. Com uma simples ordem do "attorney general" (misto de ministro da Justiça e procurador-geral), eles poderiam ser obrigados a bloquear endereços de pirataria. Se alguém digitasse thepiratebay.org, receberia a resposta: "Esse site não existe".

Diante de tantas ameaças, o Vale do Silício caprichou na grita.

Na quarta passada, a Wikipedia pintou de preto sua página principal, em inglês, e praticamente saiu do ar. Google, Yahoo, Twitter e muitos outros também engendraram alguma forma de protesto.

O site da revista "Wired", há décadas a porta-voz do Vale, saiu com partes de seus títulos principais cobertas por tarjas. Era uma alusão à vocação censora dos projetos de lei.

Clicando na manchete da "Wired", chegava-se a um editorial explicando a revolta. O texto tinha a linguagem guerrilheira típica da publicação. Com desdém, referia-se a gravadoras e estúdios de Hollywood, apoiadores das novas leis, como "Big Content" -ou seja, os grandes produtores de conteúdo.

É o jeito "Wired", tão influente e clonado mundo afora, de descrever a realidade atual: a "velha mídia", paquidérmica e desorientada, sofrendo bombardeio dos arautos do novo, vindos do Vale do Silício.

É um discurso de forte apelo romântico, sedutor para a juventude "hi-tech" que se vê como franco-atiradora contra as velhas corporações "do mal". Mas cabe perguntar: até quando Google (valor de mercado: US$ 186 bilhões), Facebook (US$ 70 bi), Yahoo (US$ 19 bi) e outros vão conseguir posar de "angry young kids", os garotos revoltados contra o status quo?

Mesmo a Wikipedia -que não tem fins lucrativos, não aceita anúncios, nem transformou seus fundadores em bilionários- ainda merece essa marca de ponta de lança revolucionária? Será que sua influência colossal já não a credencia a um posto no "mainstream", no establishment das comunicações?

Não sei até quando bater no moribundo "Big Content", na chamada "velha mídia", vai garantir às empresas de web da Califórnia essa pose de revolucionárias.

O discurso vanguardista da "Wired", ela própria um império editorial, tem muito de hipócrita. Os "revolucionários" Google, Facebook, Yahoo etc. também são conglomerados bilionários, como são/foram os estúdios de Hollywood e gravadoras. Têm as mesmas aspirações monopolistas, são igualmente obcecados pelo lucro (e esta não é uma crítica, é só uma constatação).

Já são um novo establishment, que pressiona com sucesso a Casa Branca e faz com que políticos, em um passe de mágica, mudem de opinião e posem de defensores da liberdade de expressão.

Claro que os políticos só pensam em seus próprios interesses e em se reeleger. Mas, em sua face visível ao grande público, seguiram 100% a cartilha que a "nova mídia" lhes impôs. Repetiram direitinho o discurso libertário que pega bem com o eleitorado jovem e os hipercapitalistas do Vale do Silício. A pose adolescente das corporações do mundo on-line vive seus últimos dias. Quem manda agora são elas, e seria honesto assumirem isso.


quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Imprensa gay no Brasil, o livro


Navegando no site da Folha, descobri este livro. O livro ideal para quem quer dar pra jornalista. Mas, falando sério, é claro que vale a leitura. Vou encomendar. Para saber mais, clique aqui.

domingo, 8 de janeiro de 2012

Poucos jornalistas sabem trabalhar com números

Deu hoje na coluna da Suzana Singer, ombudsman da Folha. E é fato. Volta e meia isso acontece.


A tentação dos números
Em excesso e sem a devida contextualização, cifras enchem o noticiário e não fazem sentido para os leitores
No impreciso e subjetivo mundo em que se move o jornalismo, números são tentadores. Eles conferem uma aura de cientificidade, passam a impressão de que aquela reportagem diz a verdade, que não se baseia em declarações ou opiniões.
As cifras se espalham pela Folha, muitas vezes, maltratadas. Na segunda-feira passada, a manchete dizia: "PF apurou desvios de R$ 3,2 bilhões em 2011". O título interno informava que era um recorde.
O leitor entendeu que o ano passado foi marcado pela corrupção, mas não era isso. O montante inclui somas descobertas em investigações anteriores, isto é, a malversação pode ter acontecido em 2010, 2009... Esse detalhe está perdido no texto, sem destaque.
No dia seguinte ao Natal, outra manchete brandia um número cheio de zeros: "País perde R$ 15 bi com acidentes em estradas neste ano". A reportagem principal, de apenas 14 parágrafos, tinha 15 dados.
A explicação sobre como os especialistas calculam o prejuízo com as vítimas do trânsito (os gastos no atendimento e quanto a pessoa deixa de produzir) ficou socada em poucas linhas, incompreensível.
Para evitar "pecados matemáticos", a Folha poderia adotar alguns mandamentos:
1. NÃO DIVULGARÁS NÚMEROS SEM CONTEXTUALIZÁ-LOS
É impossível saber se "os 308 consultórios de rua para tratar dependentes de crack no Brasil", a serem criados pelo governo federal, são suficientes se o jornal não informa quantos são os viciados e quantos postos desse tipo o país tem (8/12).
Da mesma forma, não faz sentido relatar que, com a crise na Europa, "saíram 76,4 mil pessoas" da Irlanda, sem citar a população total do país (26/11).
2. NÃO REPETIRÁS NÚMEROS SEM QUESTIONÁ-LOS
Alguns dados, de tão repisados, ganham ares de verdade. Em maio, o Twitter anunciou ter chegado aos 139 milhões de usuários e virou praxe falar dos "mais de 100 milhões de tuiteiros no mundo".
No último dia 10, uma coluna da "Ilustrada" citava artigo da "New York" que lançava dúvidas sobre esse dado. Descontadas as contas inativas e duplicadas, seriam 50 milhões em todo o planeta.
Não adiantou. Cinco dias depois, a Folha voltava aos "100 milhões" de usuários do Twitter.
3. DUVIDARÁS DAS FONTES
É um erro engolir estatísticas sem olhar onde elas nasceram. No último dia 14, uma reportagem sobre investimentos de sites de empregos informava que quase um terço dos internautas no Brasil acessam páginas de recrutamento. Quem calculou isso? Uma consultoria. Com que metodologia e a pedido de quem? Não sabemos.
4. NÃO TE PRECIPITARÁS
Bastou uma segunda-feira de audiência menor para que a seção "Outro Canal" concluísse que a apresentadora Patrícia Poeta fez mal ao "Jornal Nacional". A coluna do último dia 14 começava perguntando ao leitor se "já bateu saudade de Fátima Bernardes" e contava que o telejornal tinha registrado sua pior segunda-feira no ano.
Para constatar uma tendência, é preciso esperar, não adianta sacar uma conclusão com base no número mais recente.
5. SERÁS COMEDIDO
Por incompreensão ou falta de cuidado, recheia-se o noticiário com tanto número que ele se torna indigesto. Talvez o mandamento mais importante seja resistir à tentação e fazer uma dieta de números. Início de ano novo é um bom momento para isso.

Boni zoa Bial no programa do Serginho Groissman

Vira essa boca pra lá, "colega"!

domingo, 1 de janeiro de 2012

Aula para estudantes de Jornalismo: "A síndrome do já demos isso", Suzana Singer

Lembro bem desse tipo de situação no Globo. Mais uma bela sacada da Suzana Singer, ombudsman da Folha.


A síndrome do "já demos isso"
Folha noticia mal previsão sobre o PIB brasileiro, porque "a informação foi publicada há dois meses"

"Nós já demos isso." Quem trabalha na chefia de uma Redação ouve essa frase centenas de vezes. É a resposta clássica dada por quem é cobrado por algum furo (informação publicada na concorrência).
Nas reuniões de pauta, acontece mais ou menos assim:

Chefia: Por que não publicamos uma crítica do filme X, que estreou?
Editor: Nós já demos isso.
Chefia: Quando?
Editor: Há dois meses, quando o filme foi lançado nos EUA.
ou
Chefia: O concorrente trouxe que o ministro Fulano recebe aposentadorias indevidas. Ele pode cair.
Editor: Nós já demos isso.
Chefia: Não me lembro...
Editor: Saiu quando ele foi nomeado, no início do governo. Mando um link da matéria para você.

Os diálogos não são pura ficção. As Redações funcionam, em alguns momentos, como espaçonaves em órbita, com lógica própria, descoladas da realidade.

O que adianta publicar, antes de todo mundo, a crítica de um longa e não dizer nada quando ele passa no cinema do shopping? Quem se lembra da trigésima denúncia de corrupção, a não ser quando o político está sob fogo cerrado?

A síndrome do "já demos isso" baixou na Folha outra vez na terça-feira passada. O jornal noticiou mal a previsão de que o Brasil vá se tornar, neste ano, a sexta economia mundial, passando o Reino Unido. A única reportagem falava mais da repercussão do estudo do que dele propriamente, sem nem um quadro com o ranking dos PIBs.

A justificativa: "já demos isso". De fato, em outubro, a Folhapublicou projeções do próprio FMI que apontavam a possibilidade de os brasileiros ultrapassarem os britânicos. Os dados saíram no mesmo domingo em que o ex-presidente Lula anunciou estar com câncer e não tiveram repercussão -só "The Telegraph" recuperou a informação.

O levantamento atual, noticiado pelo "Guardian", foi recebido com estardalhaço, virou manchete nos concorrentes da Folha, saiu no exterior ("El País", "Le Monde", "Financial Times") e motivou uma entrevista do ministro da Fazenda.

Na hora do "buzz", não faz sentido se calar e apostar que as pessoas vão lembrar-se de uma notícia de dois meses atrás. O leitor da Folha não vive em uma bolha alimentado apenas pelas suas páginas. Ele vê TV, navega na rede e, nos casos importantes, espera que o impresso analise e contextualize o fato.

A Redação não vê erro de avaliação no caso do PIB. "A notícia era velha, já tínhamos publicado com destaque em outubro. A consultoria britânica chegou à mesma conclusão, sem acrescentar nada ao que o jornal já havia dado", diz Ricardo Balthazar, editor de "Poder".

Ele acha que o artigo do "Guardian" só ganhou destaque "por causa da seca de notícias". Foi o que Vinicius Torres Freire chamou de "ninharias midiatizadas" na "leseira noticiosa de finais de ano".

Pode até ser, mas ele dedicou duas colunas ao assunto, explicando ao leitor a (ir)relevância de a economia nacional galgar mais um posto. Fez o que se espera do jornal, em vez de ignorar o assunto, porque, afinal, "já demos isso".

Antologia do colunismo: a sacola é dele e ele "trusse" primeiro

Deu hoje na coluna do Ancelmo.