segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

Aula Geral (ombudsman da Folha): A Imprensa é SENSACIONALISTA?

A coluna do Marcelo Beraba, na Folha de S. Paulo, é sempre uma boa aula. Sempre uma boa reflexão.

observadores
Emoção e histeria
Masakata Ota, pai do menino Ives Ota, seqüestrado e morto em 1997 em São Paulo, avalia como "bom" o trabalho da imprensa paulista no caso de João Hélio. Na sua opinião, os jornais têm cobrado mais providências das autoridades. Não considera a cobertura sensacionalista ou excessiva. As avaliações de dois observadores da imprensa são diferentes, principalmente em relação a alguns jornais do Rio.

Inácio Caño, sociólogo do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro:
"Estou achando a cobertura péssima. Em primeiro lugar, pelo excesso de exposição. Alguns jornais do Rio deram metade da Primeira Página para a notícia como se tivesse estourado a Terceira Guerra Mundial.
Em segundo lugar, a cobertura é muito emocional. Alguns jornais estão em campanha pela redução da maioridade penal. Há uma mistura entre uma posição editorial, a qual os jornais têm todo o direito, e uma cobertura jornalística que acaba influenciada pela posição editorial. Número três: há fatos graves que alguns jornais simplesmente omitiram por conta dessa cobertura tão emocional. Se você vê aquela foto dos acusados, tem um cara sendo esganado. E isso, na maior parte dos jornais nem sequer é comentado.
Com o passar dos dias, os jornais evoluíram para uma cobertura mais reflexiva, mas inicialmente a cobertura foi extremamente emocional.
Evidentemente não é um problema só da imprensa, mas a imprensa acaba estimulando essa reação emocional das pessoas e dos políticos. Várias propostas estão andando, depois vão parar até o próximo caso. Acho que a imprensa deveria fazer um pouco de autocrítica sobre a cobertura.
É claro que o jornal tem de mostrar a notícia, é uma notícia perturbadora e tem de ter difusão. Mas acho excessivo esse patamar de exposição. O "Jornal do Brasil", do Rio, deu como manchete "O que eles merecem?". Era um convite ao linchamento. E mostra muito claramente a diferença de uma cobertura emocional de uma cobertura mais objetiva".

Silvia Ramos, coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes:
"Apesar dos problemas, a imprensa tem modificado, para melhor, o tratamento que dá aos temas associados à violência, criminalidade e segurança pública nos últimos anos. A mudança mais forte é o abandono, pela maioria dos jornais, de recursos sensacionalistas e noções apelativas, como a publicação de fotos chocantes e o estímulo ao uso de violência pelas forças de segurança, recomendando que a polícia elimine criminosos ou desrespeite direitos para combater o crime. Algumas coberturas são exemplos de que é possível fazer um jornalismo ao mesmo tempo investigativo e capaz de mudar a realidade, como a dos ataques do PCC em São Paulo, em 2006. A imprensa praticamente interrompeu a escalada de mortes provocada pela polícia em reação aos atentados.
Por isso foi surpreendente a resposta da maior parte dos jornais do Rio, com manchetes apelativas no caso do menino João Hélio. O acúmulo de experiência na cobertura de grandes crises foi abandonado. Para se identificar com a indignação de seus leitores, vários jornais perderam o tom e acabaram reproduzindo uma combinação de perplexidade e histeria. Algumas manchetes, mesmo dos principais jornais, entrarão para a história dos grandes erros da imprensa".

Fonte: Folha de S. Paulo (domingo, 18/02/2007)

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