domingo, 21 de setembro de 2008

O ombudsman e as cartas. De novo!



Como meus milhões de leitores, digo, bilhões (quase esqueço dos chineses), sabem, leio sempre as seções de cartas. E concordo com o ombudsman (todos, aliás). Enche o saco ler cartas de autoridades e assessores.

Água mole em pedra dura...
Carlos Eduardo Lins da Silva

FAZ 18 anos, nove meses e três semanas que esta coluna tratou pela primeira vez da seção "Painel do Leitor". Seu titular era o primeiro ombudsman da Folha, Caio Túlio Costa. O tema apareceu 31 vezes nesta página. A mais recente, já no meu mandato, em 13 de julho deste ano.

Todos os ombudsmans defenderam que o espaço da seção de cartas do leitor não fosse ocupado por personagens da notícia ou seus assessores. A demanda é uma das mais freqüentes que lhe chegam.

Diversas sugestões foram feitas para resolver o problema: aumentar a seção, criar uma só para contestações ou direito de resposta, incluir o "outro lado" nas páginas do noticiário, seguir o modelo do "Washington Post", que aos sábados dá uma página inteira de cartas do leitor.

A Redação tem permanecido impermeável a essa chuva de apelos. Responde sempre que "as autoridades também são leitores", que é "democrática" a divisão do espaço entre "especialistas e anônimos".

Não concordo. Nem aceito nenhuma das justificativas dadas aos nove jornalistas que ocuparam este cargo. Não é nada democrático que pessoas que já têm ampla possibilidade de expressar sua opinião tomem um dos poucos espaços dos que a têm muito limitada.

Ainda mais porque o limite de tamanho imposto às cartas dos comuns não se aplica aos célebres. Sem contar que quase sempre a carta do famoso recebe tréplica da Redação, o que diminui mais a área do leitor.

Bernardo Ajzemberg, ombudsman entre 2001 e 2004, apontou com razão que um dos motivos por que o jornal publica tantas contestações de pessoas noticiadas é provavelmente a falta de aplicação de seus repórteres no cumprimento da obrigação de ouvir devidamente o outro lado.

Assim, o leitor é punido duplamente: não tem os dois lados da história no dia em que ela sai e tem encurtada a chance de ver sua opinião publicada no jornal. Também a autoridade sai perdendo porque para ela é muito melhor ter sua versão ao lado da que contesta.

As cartas ao editor são uma tradição da imprensa ocidental. Na Inglaterra do século 19, elas amplificavam a voz dos que só podiam se expressar ao público no Speaker's Corner do Hyde Park. Nos EUA, o intelectual e escritor E. B. White dizia, em 1950, que "o privilégio de escrever ao editor é básico" e que as cartas de leitor são "o prato quente do cardápio de pratos feitos da América".

Nos tempos de blogosfera, seções de cartas de leitores em jornais impressos são oásis de boa educação, civilidade e respeito na expressão de pontos de vista discordantes. Deveriam ser ampliadas.


A Folha é, entre os três grandes da imprensa brasileira, o que menos cartas de leitores publica em média, como constatou o ombudsman Marcelo Beraba em 2005, e continua.

Criou um aditamento eletrônico, que dobra o número de cartas aceitas (www1.folha.uol.com.br/folha/paineldoleitor/), mas não satisfaz a maioria absoluta dos leitores.

Foi por causa desse pleito até agora não atendido, que meu antecessor imediato, Mário Magalhães, recebeu mensagem que dizia: "o ombudsman é como peito de homem, não serve para nada".

Eu pretendo continuar com o tema em pauta para ver se o título desta coluna vai terminar com "... tanto bate até que fura" ou com "... tanto bate até que seca".

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