sábado, 27 de setembro de 2008

"A reportagem morreu? Viva a reportagem!", Ricardo Kotscho

Fiquei três dias sem computador em casa. "Que loucura!", como diria a "gênia" da Comunicação, Narcisa, que também deve achar graça do que não é espelho. Passei todos esses dias olhando pro monitor e cantando aquela sucesso da Adriana Calcanhoto: "Amor sem beijinho, Buchecha sem Claudinho, Sou eu assim sem você Circo sem palhaço, Namoro sem amasso, Sou eu assim sem você...". Agora, meu computer, em vez de entrar direto no meu blog, está entrando na página do IG. E leiam abaixo a "pérola" que está rolando na coluna do mestre Ricardo Kotscho. Nem li ainda (vou ler depois do café), mas gostei. Ricardo, que foi assessor do Lula em campanha e na presidência, é um dos maiores repórteres brasileiros. Tive a sorte de ir a esse debate na PUC. Que aula! Duas feras!

A reportagem morreu? Viva a reportagem!
Ricardo Kotscho

Trinta anos atrás, em tempos ainda de ditadura militar, José Hamilton Ribeiro, o maior repórter brasileiro, em atividade faz mais de meio século, e eu, fomos ao Rio (de carro, lembro-me bem) para participar de um debate no auditório da ABI (Associação Brasileira de Imprensa).

Moderado pelo Alberto Dines, o debate tinha por tema uma pergunta: “A reportagem está morrendo?”.

Ano passado, participei de outro debate, na PUC do Rio, com o mesmo Zé Hamilton. Desta vez, o moderador fui eu, e o tema era, acreditem se quiser: “A reportagem está morrendo?”.

Como o Zé manca de uma perna, que perdeu na explosão de uma mina na cobertura da guerra do Vietnã, e eu da outra, depois de quebrar o joelho num tombo besta, ele fez a brincadeira de sempre:

“Se a reportagem está morrendo, eu não sei, mas nós continuamos sobrevivendo disso. O jornalismo só não faz bem pras pernas...”.

“Nem pros cabelos...”, acrescentei, apontando para a minha vasta careca, como se fosse preciso.

Na última terça-feira, lembrei destas e outras histórias, em novo encontro para discutir os rumos da reportagem, no lotado auditório da Faculdade Metodista do ABC, que tinha muita gente sentada no chão até o final do debate, mais de dez horas da noite.

Desta vez, estava a meu lado o fotógrafo Hélio Campos Mello, parceiro de muitas reportagens em jornais e revistas, agora “publisher” da “Brasileiros” (ver site aqui no iG), a revista onde escrevo desde o primeiro número, lançado no ano passado.

É uma batalha chegar a São Bernardo do Campo com o cada vez mais infernal trânsito de final de tarde naquela região. Já fui na Metodista inúmeras outras vezes e, para falar a verdade, ando cansado de repetir sempre as mesmas histórias sobre reportagens que fiz ao longo destes mais de 40 anos.

Mas, quando vejo o entusiasmo desta moçada ao falar do assunto, fico parecendo um deles, lembrando de mil histórias, a todo momento atropelando meu velho amigo fotógrafo.

Que estranho fascínio este ofício de repórter desperta na moçada dos cursos de Jornalismo, que é o mais disputado atualmente nos vestibulares?

Todo mundo sabe que o salário em geral não é dos melhores, que é difícil começar nesta profissão, que você tem que se dedicar full-time ao trabalho, e acaba esquecendo a família e a vida pessoal, que é uma luta para fazer e publicar reportagens hoje em dia, nestes tempos de jornalismo fast-food, mas eles insistem. Ainda bem...

Quando conto para eles que chegava a ficar um, dois e até três meses me dedicando a uma única reportagem, para contar uma história completa, com começo meio e fim, eles ficam com inveja ou não acreditam no que estou falando.

Porque, hoje, é normal você ter que escrever três matérias por dia (hoje mesmo, no meu blog, o “Balaio do Kotscho”, também aqui no iG, acho que já postei uma meia dúzia).

Voltando para casa pela velha via Anchieta de tantas lembranças, desde que me tornei uma espécie de correspondente de guerra nas greves metalúrgicas do ABC, no final dos anos 70 do século passado, fiquei pensando como, apesar de tudo, valeu - e vale - muito a pena ter escolhido este ofício. Até porque, não sei fazer outra coisa...

Ainda bem que tem uma juventude animada para continuar contando estas histórias do povo brasileiro em forma de reportagem - a essência e a alma do melhor jornalismo.

A reportagem andou mesmo perigando nas páginas da nossa imprensa de papel nestes últimos 30 anos, mas acho que nunca esteve tão viva como agora, com novas e velhas publicações abrindo espaço para este gênero que jornalistas como José Hamilton Ribeiro transformaram em arte, desde os tempos da velha revista “Realidade”, um marco histórico na imprensa brasileira.

Vai ver que é daí que vem esta paixão, que não acaba, dos nossos jovens estudantes de jornalismo - são milhares deles pelo Brasil afora - pela vida de repórter.

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