sábado, 24 de novembro de 2007

Jornalismo no Cinema - 2 ("O preço de uma verdade")


Resenha
Murilo Souza (UFSC)
Stephen Glass era um azougue. Falante e persuasivo, conseguiu ser o destaque em grande parte das reuniões de pauta da publicação americana The New Republic. Escoltado por uma argumentação veemente, transformou suas idéias em reportagens que se consagraram nas páginas da revista. Para cada sugestão, uma matéria. Para cada matéria, uma estratégia. Invariavelmente ardiloso, o jornalista teve sua trajetória profissional retratada em um longa-metragem de 103 minutos, lançado em 2003, mostrando um detalhe que ele mesmo tentou manter em segredo por muito tempo.

Aos 26 anos, Glass já havia escrito para as revistas George, Harper's e Rolling Stones. P essoas e fatos insólitos, com todas as suas nuances, sempre estiveram ao seu alcance. Era considerado um ícone. Tanto que em certo momento, convidado pela direção da universidade onde estudou, passou a dar palestras falando sobre sua carreira. Já famoso, chegou ao cargo de editor-associado da conceituada revista de política e atualidades The New Republic, a única a circular dentro do Air Force One – o avião oficial do presidente dos EUA.

O brilhantismo do repórter começou a entrar em colapso quando em uma das reuniões de pauta da revista ele se propôs a escrever sobre a vida de um hacker de 13 anos de idade. Aprovada a idéia, a fantástica reportagem, publicada em 1998, com o título O Paraíso dos Hackers , contava a história de um adolescente prodígio capaz de burlar e invadir o sistema de informações de uma grande empresa de softwares. Nela, entre outras coisas, Glass mostrava como seria a relação indecorosa entre o adolescente e a empresa, logo após o garoto ter sido contratado para ser consultor de segurança. A reportagem detalhava ainda uma série de provocações inescrupulosas, geralmente baseadas em chantagens e demandas fúteis , feitas pelo jovem nerd.

Cobrado pelo chefe por não cobrir o assunto, Adam Penenberg, repórter da Forbes Digital, passou a investigar a história por conta própria. Para sua surpresa, descobriu que a matéria não passava de uma farsa, uma invenção. A partir de uma checagem das informações, o repórter da Forbes ficou sabendo que Glass, minuciosamente, havia inventado não só o adolescente, mas também um encontro nacional de hackers, a própria empresa de softwares e, inclusive, o conjunto de exigências feitas pelo garoto enquanto negociava para se tornar o consultor de segurança da empresa. Com o objetivo de despistar a checagem dos fatos, Glass costumava forjar as próprias anotações. Uma investigação mais aprofundada mostrou que dos 41 textos publicados, 27 foram total ou parcialmente inventados por ele.

Cinco anos depois da publicação de O Paraíso dos Hackers, o principal segredo da vida profissional de Stephen Glass aparece agora retratado em O Preço de uma Verdade, do roteirista e diretor Billy Ray. No filme, que teve seu roteiro b aseado em um artigo de Buzz Bissinger – escrito para a revista Vanity Fair em setembro de 1998 –, Glass é vivido pelo ator Hayden Christensen ( Star Wars ) . Com destaque para a agilidade da narrativa, o longa-metragem é simples, envolvente e não compromete ao apresentar as novidades no momento certo, evitando o desânimo e o cansaço do espectador. .

Em entrevista à Associated Press , Glass revelou: “ Eu me detestava. Não me achava bom como jornalista, como filho, como irmão, como amigo, como namorado. Acho que enganei as pessoas para elas pensarem boas coisas de mim.” O labirinto complexo onde ele se meteu é mostrado no filme quando, mesmo depois dos primeiros indícios de fraude, tenta sustentar a existência de todas as pessoas e situações narradas em suas matérias “ Para cada mentira que eu contava, era necessária outra para sustentá-la. Assim, era uma sobre a outra” , diz ele.

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