domingo, 23 de dezembro de 2007

Jornalismo crítico quando deve ser crítico

Do ombudsman da Folha, Mário Magalhães:

O mundo visto por lentes sombrias
Houve um repórter que respondia sempre do mesmo modo quando a emissora em que trabalhava o acionava para dar as novas da seleção. Ao "Tudo bem?", devolvia a exclamação: "Tudo bem!". Mesmo que o time estivesse em uma crise danada. Tornou-se conhecido como "Repórter Tudo Bem".

Esse tipo de jornalismo oba-oba, que se confunde com o animador de auditório ou o bobo da corte, distorce tanto a realidade como o da escola "cri-cri", habituado a ver o mundo com lentes sombrias, mesmo com o sol a pino. Volta e meia, a Folha se perde nessa sombra. No domingo, o que era suposição razoável em artigo opinativo apareceu como obsessão na peça noticiosa sobre a decisão do Mundial. Título: "Jogo do tetra ameaça ser tétrico". "Linha-fina", abaixo: "Com Milan de um atacante só e Boca forrado de volantes, final no Japão tem tudo para ser amarrada".

À arrogância da adivinhação, somou-se a leviandade da insistência, na abertura: "A final do Mundial de Clubes em Yokohama [...] não deverá ser um jogo atraente". Foi um jogaço, goleada de 4 a 2 para o Milan. Pode ser pior, com a partida já vista, como quando o Barcelona derrotou por 2 a 0 o Glasgow Rangers em novembro. Esporte titulou "Ofuscado, Ronaldinho dá vez a jovem recordista". O texto seguiu na mesma batida.

Já o diário "El País", de Madri, estampou: "Ronaldinho lidera o triunfo azul e grená". "El Periódico", o melhor jornal catalão, encheu a bola do craque. A publicação especializada "Sport" destacou a "recuperação do brasileiro". Não é só no futebol. Nos Jogos do Rio, em vez de aguardar o fim da competição de ginástica, a Folha antecipou: "De potência, Brasil vira aprendiz no Pan". Logo jorraram medalhas inéditas para a modalidade.

O jornalismo crítico tem compromisso com os fatos. Se os fatos não são trágicos, não há como relatar tragédias.

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