terça-feira, 25 de setembro de 2007

Por dentro da Tropa de Elite, Tatiana Arruda


Tem alunos que deixam a gente com a sensação que vale a pena investir na dura vida de professor. Tatiana Arruda me deixou orgulhoso. Leiam o belo texto que ela publicou no Jornal de Debates (www.jornaldedebates.com.br) no tema sobre a polícia desacreditada. A moça entrevistou, em off, um soldado da PM. Vale a pena também ler o texto de outra aluna, a Bruna Abs, no mesmo debate. De ontem para hoje foram três elogios de leitores e destaque na Nota do Editor.

Por dentro da Tropa
A polícia está desacreditada pela própria polícia. Em entrevista, um soldado da PM, L.F. (que pediu para ter sua identidade preservada) conta como a corrupção acontece dentro dos batalhões.
Tatiana Arruda

O filme "Tropa de Elite", além de criar muita polêmica sobre a pirataria, despertou a sociedade para uma realidade camuflada: a corrupção dentro da polícia. O nível de descontentamento da população com essa corporação cresce a cada denúncia nos jornais. No entanto, não paramos para refletir sobre como é o outro lado. Um lado muitas vezes silencioso e sem espaço na mídia.

Em entrevista, um soldado da PM, L.F. (que pediu para ter sua identidade preservada) conta como a corrupção acontece dentro dos batalhões.

Com sete anos de profissão, L.F questiona se a corrupção está dentro da polícia ou na própria sociedade. Ele afirma que assistiu ao filme de José Padilha e se impressionou com o retrato detalhado do seu cotidiano. Sobre a prática do "faz me rir", ele cita um exemplo real: "Fui trabalhar em uma área interna, que faz serviços administrativos. Estava ajudando muitos colegas e um policial de outra seção veio me dizer pra não fazer aquilo sem o conhecimento do chefe dele, pois eu estava atrapalhando os negócios. Para ter autorizado o inicio da sua licença especial, um policial paga em média R$ 300,00 reais".

L.F. revela que os preços variam de acordo com as patentes "Depende de quem está à frente do esquema. Quando é um oficial, os auxiliares têm que pedir mais alto, pois o chefe leva mais. Quando são os auxiliares que comandam, o preço é menor". Para o soldado, a existência de policiais desonestos x honestos divide a polícia em duas, e como a personagem Capitão Nascimento, ele iguala policias corruptos aos bandidos: "Lá dentro somos todos amigos, mas sabemos quem é quem e podemos escolher com quem trabalhar, realmente existem duas PMs".

No filme são exibidas cenas que mostram a desordem na oficina do Batalhão da PM, fato que chocou o nosso Governador Sérgio Cabral, segundo blog do Mauro Ventura no globo online. No dia-a-dia isso não é diferente. L.F. conta que teve que desmontar três carros para construir um que funcionasse, além disso, já encontrou viaturas sem pneus nas ruas, apoiadas em cima de tijolos. Coletes balísticos fora da validade também fazem parte do equipamento de trabalho oferecido pela instituição e quem for pego sem o acessório pode ser repreendido com prisões administrativas.

E para quem acredita que não existem pessoas honestas dentro da polícia, L.F, proclama o contrário: "Nunca peguei nada de ninguém e não aceito dinheiro por nada. Uma vez eu estava patrulhando e vi uma pessoa fazendo gato em um orelhão. Detive o indivíduo, que era médico, em flagrante por furto de sinal e o conduzi pra Delegacia. Ele só acreditou quando chegamos à DP e viu que seria autuado, disse que todo homem tem um preço e me ofereceu R$ 50,00 para liberá-lo. Aceitei o dinheiro e quando ele me entregou a nota eu o prendi por corrupção, nessa hora ele começou a chorar". O soldado aponta a população como principal agente corruptor já que, segundo ele, prefere subornar policiais a evitar infrações, como uma apreensão de um veículo devido ao IPVA atrasado.

Quando perguntado se há solução para a corrupção dentro da instituição, o soldado diz que o problema é o financiamento do tráfico pelos viciados, "sem o consumidor o produto não tem sua razão de existir". Afirma, ainda, que o aparelho policial não consegue ser eficaz, pois existe uma guerra velada que serve de motivo para a compra de armas e é interessante a alguém. E por trás disso estão os esquemas internacionais e a lavagem de dinheiro. "Espero que as pessoas coloquem na cabeça que somos apenas peões nesse jogo de guerra e passem menos tempo criticando os policiais e mais tempo cobrando novas legislações que acabem com esse conflito", afirma o soldado cansado de guerra.

2 comentários:

Micha disse...

Também já assiti ao filme e dói ver sem máscara alguma o que todo mundo já sabe, mas quase ninguém tem coragem de divulgar, a corrupção na polícia. Assim fica difícil pensar num futuro melhor para nosso país.
Parabéns pela matéria!

PC Guimarães disse...

Obrigado pela visita, Micha. E, especialmente, pelo elogio ao belo trabalho da aluna. Pelo seu bilhete dá para perceber que você escreve bem. Escreva para o Jornal de Debates também. Será bem-vinda (o).
grande abraço