quinta-feira, 5 de abril de 2007

Ivan Lessa na BBC Brasil

Rizoneirices
Outro dia mesmo, aqui neste cantinho livre e trigueiro, andei falando de minhas sérias dúvidas quanto à legitimidade de um verso da Aquarela do Brasil, do Ary Barroso, conforme a gravação original de Francisco Alves, tido como “O Rei da Voz”.
Dúvida leva a dúvida. Assim é que passei a prestar mais atenção no tocante e ouvinte de minha leitura na Net dos jornais brasileiros. Pois esta é a verdade: embora distante 29 anos e 3 meses de meu Brasil, aquele Brasil brasileiro do samba e do coqueiro, conforme queria Ary Barroso, eu não deixo de ler o máximo que posso os jornais brasileiros.

Acompanho de longe, assustado e sempre curioso, o Brasil e suas brasilidades – o Brasil “rizoneiro”, conforme cunhou no estúdio de gravação Chico Alves, ao contrário de “insoneiro”, para citar a palavra precisa que o grande Ary Barroso queria, na versão original da Aquarela.

Pois bem, passei eu a notar que, de uns bons 15 anos para cá, para dar uma medida de tempo arbitrária, eu não entendo patavinas, para empregar uma expressão muito em moda quando do lançamento do samba-exaltação (1939) que, prometo, não citarei mais nesta croniqueta.

Na falta de uma expressão melhor para a minha falta, passei então a chamar de “rizoneiras” todas as minhas incompreensões, todas as minhas “boiações” diante de nossa imprensa e seu noticiar.

Tenho a impressão que leio colunas e notícias assim como me perfilava no pátio do colégio quando era desfraldada e erguida nossa bandeira e, todos juntos, cantávamos os hinos patrióticos que, se não me engano, era coisa obrigatória na época da ditadura Vargas: um dever a ser cumprido sem maiores perguntas e, uma vez liquidado, ir em frente para ler o gibi escondido dentro do livro de, digamos, geografia.

O meu estar por fora aqui fora e longe passei a chamar de “rizoneirices”, em suma. Leio, retenho na memória por uma fração de segundo o fato e sigo em frente acompanhando as balas perdidas no Rio. Afinal, não deixo de ser uma delas, só que vim parar, vim a ser encontrado, em Londres.

Indo à vaca fria

Tomei umas notas desde que me predispus a revelar minhas “rizoneiras” posições. Sei o nome do presidente da República, gravei as iniciais do partido a que pertence e... E o resto é meu assombro, meu pasmo, minha indiferença.

E vou logo justificando a indiferença para que os patriotas mais exaltados (se é que existe um tipo que não o seja) não me mandem emails com vírus, minhocas e minhocões ou venenosas infecções: fico indiferente para não enlouquecer, para não ir de vez para a cucuia (viram como estou por dentro em matéria de nosso linguajar?). Às minhas perplexidades, sem comentários:

- Com que então Lula manteve Guilerme Cassel no Desenvolvimento Agrário? Ora, pois, pois.

- Blogs de PMs exibem revolta.

- FAU terá residência em habitação popular.

- Esportes: Muricy colocou mistão no clássico.

- Incór pára atendimentos.

- Técnicos da CEDAE são recebidos a tiros.

- STF dá liminar em favor do apagão aéreo.

- Em São Paulo, governo reformula Escola da Família.

- Eliminadas do BBB agora se rivalizam nas bancas.

- Enem pode substituir vestibular.

- Novo blog: Tabajara dos Reis tira dúvidas

- 'Jota Quest' católico vai substituir Sandy & Júnior

- Qwerty Uiop: um ASDF na JKL.

Esse último eu inventei. Não é uma “rizoneirice” pura. Mera sacanagem com teclado de computador. Mas, para quem está fora e por fora há tanto tempo, leva todo o jeito de verdade, como queria Orson Welles.

Bolas, eu não tenho jeito mesmo! Nada entendo do que se passa aqui mesmo diante de meu nariz, no Reino Unido, com rainhas e primeiros-ministros e embarcações navegando (ou não) em águas iranianas, por que raios hei de me meter com o que passaram a ser, para mim, partidos, ministérios, apagões e iluminações dos outros? Isso aí: cheguei a uma idade em tudo e por tudo – pois é – “rizoneira”.

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