Crise nos jornais pressiona faculdades a mudar ensino do jornalismo
Carlos Castilho (Observatório da Imprensa)
O debate sobre a urgência de mudanças no exercício do jornalismo profissional transferiu-se também para dentro das universidades norte-americanas onde o papel das faculdades passou a ser severamente questionado.
Logo depois do ano novo, cerca de 30 diretores de faculdades de jornalismo em universidades norte-americanas, editores chefes e executivos da imprensa se reuniram em Nova Iorque, num brain storm fechado para tentar definir um novo papel para os cursos de graduação, num momento em que a mudança de rotinas nas redações torna-se cada vez mais rápida e irreversível.
O dilema dos participantes era o seguinte: a adaptação dos jornais à nova realidade informativa gerada pela internet exige profissionais que não estão disponíveis no mercado porque as faculdades não os estão formando e as empresas já não podem mais suprir esta lacuna.
“ Nós estamos estamos ficando sem alternativas”, constatou o todo poderoso Bill Keller, Chefe de Redação do The New York Times, num desabafo surpreendente. “As escolas de jornalismo são a nossa última esperança”, completou Bill, depois de admitir que sua receita para os jovens jornalistas já não funciona mais.
“Minha geração recomendava que todo o interessado em fazer jornalismo deveria começar num jornal do interior fazendo reportagem de rua. Aprender fazendo era a regra básica. Acontece que a maioria dos jornais locais já não existe mais e os editores-tutores já se aposentaram. As faculdades acabaram se tornando a única alternativa para a renovação do jornalismo”.
Esta é a proposta básica de um ambicioso programa lançado em 2005 pelas fundações Carnegie e Knight para tentar despertar as faculdades de jornalismo dos Estados Unidos para a nova realidade da comunicação digital. O projeto chamado News21 reúne as cinco mais importantes escolas de jornalismo dos Estados Unidos.
O problema é que a mudança de currículos, e principalmente da cultura universitária em matéria de jornalismo e comunicação, está sendo mais lenta do que esperavam os executivos de jornais.
Esta situação faz com que apenas metade dos novos profissionais contratados por um jornal como o The New York Times saiam direto da universidade para a redação. O mesmo quadro se repete noutras redações e possivelmente também aqui no Brasil, onde o tema simplesmente parece não chamar a atenção nem dos executivos de jornais e nem dos diretores de faculdades de jornalismo.
O brain storm dos americanos tocou em temas muito familiares como, por exemplo, a questão da multidisciplinaridade no exercício da atividade jornalística, bem como a velha dicotomia entre formação generalista versus formação especializada, na capacitação de profissionais do jornalismo.
O problema da multidisciplinaridade, tanto lá como aqui, emperra em questões burocráticas porque as faculdades, departamentos e centros tendem a ser estanques dentro das universidades, dificultando a integração horizontal.
Os executivos de jornais precisam de jornalistas especializados porque a realidade informativa é hoje extremamente diversificada. Não basta uma conversa com um especialista para dar ao repórter a condição de expert em comércio exterior. A formação do profissional é muito mais complexa hoje em dia, e exige que o estudante de jornalismo tenha freqüentado também aulas de economia, segundo a visão dos donos de órgãos da imprensa.
As universidades ainda não conseguiram adaptar suas estruturas a esta nova realidade, da mesma forma que ainda estão atoladas no velho dilema entre a formação generalista ou especializada. Os editores responsáveis já mudaram o discurso, que glorificava o repórter polivalente, e agora sonham com profissionais especializados capazes de contextualizar rapidamente novas notícias.
As faculdades também não encontraram ainda respostas convincentes para outro dilema das redações: os cursos de graduação devem dar mais ênfase ao treinamento de futuros profissionais nas novas habilidades técnicas da era digital ou preocupar-se com o desenvolvimento do seu juízo critico, capacidade analítica, visão multimídia ou com o novo relacionamento com os leitores.
Convenhamos, não são opções fáceis. Mas pelo menos uma coisa parece que vai mudar, e rapidamente. O tradicional divórcio entre empresas e faculdades no ramo do jornalismo, especialmente aqui no Brasil, tende a acabar, porque caso contrário, tanto um lado quanto o outro só tem a perder.
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