terça-feira, 17 de julho de 2007

Sobre dowloads e uploads (Deu na Folha)

Downloads e uploads
MARCOS NOBRE
AS PATENTES e a propriedade intelectual ocupam hoje uma posição central na produção capitalista. Os investimentos em invenção e inovação de ponta são de tal magnitude que muito poucas companhias dividem os principais mercados. No mundo virtual da internet, esse tipo de concentração e controle da produção se mostrou até agora impossível. Em seu atual estágio de desenvolvimento, a qualificação necessária para criar novos produtos e serviços se encontra dispersa e disseminada. Um consumidor é ao mesmo tempo um produtor virtual. E, como não há download sem upload, sem a invenção e o trabalho de consumidores-produtores (que fazem os uploads) não haveria fornecedores de serviços (que oferecerem os downloads).
Os gigantes mundiais (Google, Yahoo!, Microsoft) já perceberam isso há muito tempo. Não têm a pretensão de controlar a produção de conteúdos. Pelo contrário, sabem que a disseminação do conhecimento e da tecnologia é a fonte mais preciosa para os serviços que fornecem. Não é por outro motivo que pequenas companhias estão sendo disputadas a peso de ouro. Basta lembrar que um projeto de fundo de quintal como o YouTube foi recentemente comprado pelo Google por mais de US$ 1,3 bilhão.
A defesa de uma radical liberdade criativa no mundo virtual não passa apenas por garantir uma permanente disseminação do conhecimento e das tecnologias ao maior número possível de usuários. Passa também pelo combate à concentração da distribuição e da circulação. Uma das formas atuais dessa disputa é a contraposição entre o modelo da loja virtual de música, a iTunes, controlada pela Apple (ainda neste ano deve começar a funcionar a loja da Amazon também), em que o usuário paga para fazer o download, e o modelo de sites como o eMule ou Kazaa, que permitem o compartilhamento gratuito de dezenas de milhares de títulos.
Essa mesma disputa é travada também em outros campos por modelos colaborativos como os da Wikipédia e do Linux.
Em fevereiro, o presidente da Apple escreveu uma carta aberta às gravadoras com o objetivo de convencê-las a deixar de usar dispositivos de proteção para os chamados "direitos digitais". Na prática, essa música "não protegida" permite em princípio uma reprodução ilimitada, por vários meios e aparelhos. Parece mesmo que Karl Marx (1818-1883) tinha razão em considerar que o capitalismo carrega um vírus autodestrutivo. Pelo menos no mundo virtual, as ameaças à lógica da propriedade privada tal como entendida até hoje são bastante reais.

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